A ONU declarou o dia 3 de junho como o Dia Mundial da Bicicleta. A decisão foi tomada, aliás, em Assembleia Geral, no dia 12 de abril de 2018. Embora, para nós, todos os dias sejam o dia da bicicleta, ainda há reflexões a serem feitas, oportunamente.
Enquanto em inúmeras nações este dia é celebrado como uma vitória sobre a hegemonia do veículo automotor, no Brasil, algumas outras histórias, porém, menos felizes e honrosas, estão sendo contadas.
Dias atrás, o atleta, eletricista e blogueiro Felipe Ferreira, foi violentamente abordado por policiais militares no entorno do Distrito Federal. As imagens do vídeo que viralizou demonstram, para quem quer ver, o uso impróprio da força, racismo e uma tremenda incapacidade de interpretação na abordagem daqueles sujeitos que deveriam, por fundamento, proteger o povo.
Que risco à segurança pública apresentaria um jovem enquanto faz manobras radicais em uma bike? Qual a necessidade de apontar um instrumento letal para um jovem preto, desarmado, munido apenas de sonhos e uma bicicleta? Qual foi o seu crime ao se divertir em um lugar público? E, se a arma dispara “acidentalmente”, como em milhares de outros casos, o que vão justificar? Irão dizer que foi uma “fatalidade”?
Enfim, que ideia as forças de segurança, aparelhos de ordem do Estado, querem passar à população? Será que não compreendem que sustentar o medo por meio da força desproporcional e covarde não condiz com um Estado Democrático de Direito, onde todos são submetidos às normas e aos direitos fundamentais? Quem está acima da lei quando se diz estar a seu serviço?
Conversando com outros personagens da mobilidade por bicicleta no país e fora dele, meu sentimento de vergonha alheia ganhou tônus. Outro vídeo viralizou! Nele, aparece um indivíduo que esbarra, violenta, covarde e propositadamente, em duas ciclistas que trafegavam em suas bikes pela Enseada de Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro. A cotovelada intencional foi desferida por um sujeito treinado e que, também, é policial civil. Porém, o sujeito nega, como se fosse possível dizer a todos que viram o vídeo, que aquilo foi pura imaginação.
Vamos reforçar coisas que estamos repetindo há mais de dez anos: a bicicleta é um instrumento pacífico de mobilidade ativa, socialmente justo, economicamente viável, ambientalmente responsável e culturalmente internalizado.
No Dia Mundial da Bicicleta, há muito a ser celebrado e comemorado, com toda a certeza! Jamais vimos tantas bicicletas trafegando no país e mundo afora, não vamos negar os fatos, como virou prática comum nestes nossos tempos.
Percebemos que estamos avançando a passos largos, ou melhor dizendo, a fortes pedaladas civilizadas, em direção a um projeto de sociedade que seja plural, respeitoso, harmônico e mais justo.
Não me deixam mentir os dados revelados por sérios institutos de pesquisa, que reafirmam o quanto a bicicleta é um meio de transformação social concreto e parte de um movimento cidadão irreversível.
Hoje, no Dia Mundial da Bicicleta, a gente se sente parte de um grande esforço, e nos unimos a todos e todas as ciclistas, às organizações como o ITDP Brasil (Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento), a T. A (Transporte Ativo), a Planett, entre tantos outros, e também ao movimento da sociedade civil organizada, representada pelos coletivos como a UCB (União de Ciclistas do Brasil), a Aromeiazero, o Pedala Manaus, o Pedala Joinville, enfim, a tanta gente que está dando a sua real contribuição para um mundo melhor.
E, sobretudo, toda reflexão deveria gerar, também, olhares e ações melhores e mais aptas à interpretação do mundo que construímos, pedalada a pedalada. E, assim, faremos, ainda que insistam em nos tentar calar, iludir, reprimir, suprimir, silenciar, violar, violentar e desrespeitar nossa escolha. Ela sempre será pela liberdade, pela aceitação das diferenças, pela não-violência, pelo compartilhamento e colaboração.
A melhor forma de revidar é resistir e apontar outros caminhos, mais inteligentes, mais sensíveis e pacíficos.
Viva a Bicicleta, hoje e sempre!